No dia em que tomaste o rumo daquela varanda, disseste: somos apenas duas antas, não esquecemos, de nada adianta.
Esquecer?
Como se pode esquecer?
Perde-se a matéria, fica o peso do quase adultério.
A tua alma agora era mistério.
Os teus júbilos seriam sinceros ?
Um casamento leva duas vidas através do tempo. Também ostenta feridas não coaguladas a contento.
Uma união não é apenas um evento.
Envolve a lua, o sol, o universo.
O pensamento.
É fato que nada principiou. Não fiz o pedido, ficou o dito pelo não dito. Não deitamos na nossa cama. Apenas me reportasses tuas dúvidas, teus adjetivos imprecisos, tuas razões e motivos. Nunca constituímos um lar, não tivemos filhos, tu não eras o meu par. Nem eu o teu. Aqueles dizeres: antas? Esquecer? Apenas ecos, estrelas mortas, mentes absortas.
Perdi os sonhos. Engoli as palavras. Joguei fora o anel. De noivado. Trocaste-me por esse odor, o mesmo que impregna agora o corredor, por sonhos e delírios enfermos. Um cheiro insuportável que mexia com teus próprios venenos, sensações e sentimentos.
Somos sim duas antas, pois não soubemos esquecer.
Dividimos uma overdose de vida. Recordo-me das noites de prazer. Enquanto tu apenas lembravas daquilo que teus sentidos acusavam como capazes de te levar pro alto, como passíveis de freqüentar tua química. Teu asfalto. Complexo.
No hospital, procurei por alguém sem nome: guardavas apenas um telefone. Não o meu. Mas do último a te vender um punhado de ilusão. Aquilo que fez parar teu coração.
O pó.
A substância.
A melancolia de uma peste inelutável.
Será que fui eu quem não soube esquecer ou tu, que não soubestes viver ?
Dentro da minha solidão.
Texto de Marcos André Carvalho Lins
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